sexta-feira, 19 de junho de 2009

Viagem de Avião

Acordei bem disposto e tomei o café da manhã com a minha mãe e a minha filha. Peguei a mochila e fui para o ponto de ônibus na praia de Ondina, quase em frente, sob o sol fraco mas luminoso de prenúncio de inverno em Salvador. Cheguei ao aeroporto antes das onze e vi o jogo. O Brasil ganhou de 3 x 0. Dos americanos. Dia perfeito até aqui. O avião estava no horário. Desconfio desses dias até as duas da tarde. No meu vôo vinha um casal muito jovem. Ela passava sobre meu corpo para ver o que tinha lá embaixo, pela janelinha. Seu corpo jovem latejava (ah, minha mente!). O moço ao seu lado era seu irmão e gentil. Ela gostava do conforto de estar entre nós dois. Era sua primeira viagem de avião. Descobrimos coisas em comum, quando lhe disse que morava sozinho, num sítio fora da cidade (ela adoraria morar assim). Meu amor pelo mar (seu sonho de um veleiro) e, coincidência feliz, nossos projetos de algum dia viver em Salinas de Margarida, na Ilha de Itaparica, em frente a Salvador. Explorar o rio Paraguaçu. Ela, ainda ecologia pura, num veleiro, eu, cinismo de fim de linha, numa lancha. Há uma casa antiga, perto de um hotel, fechada, tombada, que eu adoraria comprar. Ela teria a pretensão de um sítio um pouco mais distante. Sussurramos docemente sobre as delícias daquele lugar. O carangodê, grande personagem de Salinas, as moquecas e a vazante da maré. Ela falava de frente pra mim, baixinho, colocando-se de modo a ocultar a nossa conversa do irmão, ao seu lado mas que assim ficava atrás de nós dois. Sua beleza infantil não me interessou muito, a princípio. Agora, assim, de tão perto, parecia uma beleza diferente, sedutora, adulta e sensual. O moço não parecia interessado na nossa conversa. E ela não tirava os olhos e nem virava o rosto quando eu a fitava muito intensamente. Minha intensa e generosa mente! Serviram biscoitos e refrigerante. Pausa entre nós. Só então consegui respirar confortável e profundamente. Virei-me para a janelinha, agora só minha, e no meu intenso cinismo contemplei as montanhas e lagos passando lá embaixo, pensando sobre como essas coisas são... Tudo acabaria como sempre, da forma que fosse. Eles seguiriam para São Paulo e gentilmente se levantaram para que eu saísse, e se despediram afetuosamente no corredor. Ela me abraçou com vigor e então quase sussurrando, os lábios acariciando intencionalmente a sua orelha direita, por entre os seus longos cabelos, sugeri: “De outra vez não coma tanto alho no almoço, é muito difícil de suportar...”.

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