sexta-feira, 3 de julho de 2009

Eu e Deus

Não sou lá muito religioso, embora reze um Pai Nosso antes de dormir, por via das dúvidas. Um dos meus critérios é acreditar em tudo, até provarem o contrário. De vez em quando me acontecem coisas. De vez em quando eu duvido. Então me encaixo em meus critérios e volto a acreditar. Em tudo. Pela simples razão de que tudo pode ser… Questão de fé. Tenho fé nos meus critérios. Me oriento, rapaz!

Deus apareceu aqui hoje cedo. No sítio. Ele começou a frequentar faz uns anos, quando escrevi aquele conto sobre o garoto esquecido pelo destino. Ele não aparece, obviamente, pela minha fé, mas porque acha que O entendo, nas Suas dificuldades com essa coisa de mandar no destino de tanta gente. Da primeira vez me disse: “Olha aqui, moleque, se acha que é fácil tente escrever um romance com apenas dois personagens, mas tome conta da vida deles todas as horas dos dias, e não como vocês fazem, acompanhando apenas os breves momentos quando as coisas que lhes interessam acontecem!”. Rabugento, foi embora. Passou a frequentar-me sempre que alguma manobra lá de cima Lhe parece mais complicada ou cansativa. Como a me dizer: e essa? Viu como foi difícil? Viu como foi que eu resolvi?

Deus não viria aqui apenas para jactar-se. Ontem estive pensando naquela garota que sobreviveu ao acidente do Airbus. Ela disse: “Nós vimos quando o avião caiu no mar. E então já me lembro de estar na água, agarrada a uma parte que flutuava. E que depois apareceu o navio, e o homem jogou a bóia e em seguida veio nadando para me levar”.

O navio levou mais de dez horas para achar a garota, e isso aconteceu à noite, sob condições absolutamente improváveis. Ela é a única sobrevivente entre mais de cento e cinquenta pessoas que estavam a bordo. A sua mãe estava sentada ao seu lado e morreu. A garota ainda não sabia de nada disso.

Ele chegou cedo, estava entre fatigado e orgulhoso. Queria falar sobre o assunto:

Já é difícil juntar mais de cem pessoas para esses finais comuns. Cada vida conduzida em detalhes, desde o nascimento até o dia fatídico, cento e cinquenta motivos, cento e cinquenta passagens, tripulação combinada, avião preparado e então aparece aquela linha solta no chão… Quem botou essa garota aí!!??? Ribombei pelos céus meu vozeirão, apareceu anjo de tudo que é lado, mandei costurar o novo enredo: vai parecer milagre, mas fazer o que? Providenciem que ela saia antes do impacto do avião, que se machuque apenas o tanto certo para dar verossimilhança à cena, que a água não a congele e que pelo menos um daqueles navios chegue perto o suficiente para salvá-la, nem que seja noite e que alguém tenha que pular na água fria! Entendido? Saiu anjo pra tudo que é lado… Hahahaha!

Bingo! Saiu tudo certinho! Cê viu?